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A malandragem de Delfim Netto com o projeto das grandes fortunas

A economista Maria da Conceição Tavares havia deixado o PMDB e ingressado no PT. Disputou e ganhou as eleições em 1995 para deputada federal.

Convenceu o PT a levar adiante o projeto de taxação das grandes fortunas. Ou seja: regulamentar o artigo 153, inciso VII, da Constituição Federal.

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Curioso: o projeto era do então senador Fernando Henrique Cardoso, apresentado em 1989.

Seis anos depois (1995), FHC subia a rampa do Planalto, surfando nos elogios dos jornalões ao Plano Real. O PT ficava na oposição. Aos 65 anos (40 deles no Brasil), aposentada da UFRJ, a economista portuguesa, naturalizada brasileira, temperamental, incisiva e ácida nas discussões sobre a desigualdade social e econômica no país, assumia seu primeiro- e único- mandato na Câmara Federal, pelo Rio de Janeiro.

Tinha pouco mais de 20 anos quando foi obrigada a fugir de Portugal, sob a ditadura de Antônio de Oliveira Salazar.

Chegou ao Brasil em fevereiro de 1954. Em agosto, Getúlio Vargas cometeu suicídio. Dez anos depois, veio o golpe militar. Em 1968, Maria da Conceição Tavares foi ao exílio no Chile, voltando ao Brasil em 1972.

Crítica implacável dos planos econômicos, de Sarney a Collor, era chamada de “a mãe da equipe econômica” que chefiava o país naquele 1995: os ministros Pedro Malan e José Serra. Mesmo assim, não poupava ninguém nas análises.

E logo nos primeiros meses de mandato, com o apoio do presidente do PT José Dirceu, Maria da Conceição Tavares resgatou o projeto de lei complementar de FHC. Atualizou e reformulou o projeto: no Brasil, quem recebia até dois salários mínimos, ficaria isento de pagar imposto de renda. Acima disso, seriam aplicadas quatro alíquotas diferentes, variando de 5% a 50%.

O projeto de FHC propunha as 4 alíquotas, porém com impostos menores, entre 0,3% e 1%.

“Eu estou com o projeto das Grandes Fortunas parado. Vai passar? É até do presidente da República. Mandei reformular, reestudei tudo, pedi assessoria da legislativa do Congresso, está prontinho, tinindo. E agora? Passa? Não, não está considerado. Mas é do presidente, meu Deus!”, afirmava com sua conhecida ênfase e paixão a economista, em entrevista ao Roda Viva de 21 de agosto de 1995.

O projeto não passou. E anos depois, contou uma malandragem usada pelo deputado federal Delfim Neto, o czar do milagre econômico (1969-1973), na ditadura militar, para que a cobrança nas grandes fortunas não saísse do papel.

Delfim Netto sabia que isso não passaria no Congresso. Para não desagradar Maria da Conceição Tavares, assinou o relatório dela e convenceu correligionários a fazerem o mesmo.

“E foi ao plenário! Delfim era de um modo geral gentil e educado. Bem malandro!”, resumiu a professora no volume 14, número 24, do Cadernos do Desenvolvimento, do ano 2019.

Fora da política eleitoral, Maria da Conceição Tavares segue defendendo a mesma toada.

A taxação das grandes fortunas, porém, ainda é uma casca dura de romper.

(Esse texto continua)

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