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A ditadura e o bebê

Edson Luiz- Correio Braziliense

A Câmara dos Deputados está a um passo de reduzir a profundidade do fosso que, nos últimos anos, tem separado o Congresso Nacional da sociedade brasileira. O aumento da remuneração e as vantagens criadas pelos próprios parlamentares acabaram criando um distanciamento exagerado entre a realidade dos salários da maioria dos eleitores e a efetiva remuneração de seus representantes no parlamento. Líderes partidários concordaram em colocar em votação hoje proposta que concede a condição de urgência urgentíssima ao projeto de extinção de velha e injustificável vantagem que vem sendo paga há tempos a senadores e deputados: o 14º e o 15º salários, em dezembro e fevereiro de cada ano.

Ao aprovar o regime de urgência para a matéria, os parlamentares decidiram dar um fim ao arrastado processo que permitia postergar ou simplesmente suspender a votação do projeto que, desde maio, já tinha sido aprovado pelo Senado, passando a depender apenas da Câmara para entrar em vigor. É que, tão logo for aprovada a urgência, a matéria poderá ser, na mesma sessão, votada e aprovada em plenário, dispensada a tramitação pelas comissões de Finanças e de Constituição de Justiça (CCJ), onde estaria sujeita a pareceres e pedidos de vista. É condição que só se confere a assunto que a Casa pretende dar como encerrado o mais depressa possível.

Já não era sem tempo. Como toda vantagem pecuniária criada para beneficiar os políticos com assento no Congresso, o pagamento dos dois salários extras tinha se propagado em cascata por quase todas as assembleias estaduais e câmaras de vereadores de várias capitais. Mas, pressionadas pela opinião pública cada vez mais ativa na democracia, muitas casas legislativas estaduais e municipais acabaram constrangidas a abolir esse pagamento. Foi emblemática para todos os legislativos do país a intensa campanha popular que permitiu ao eleitorado do Distrito Federal comemorar, amanhã, o primeiro ano da extinção do privilégio. Em Minas, outro exemplo, a Assembleia Legislativa aboliu em setembro o pagamento anual da vantagem mantendo apenas um salário extra no primeiro ano e um no último de cada mandato.

Para ter uma ideia da economia de recursos públicos que se fará na Câmara e no Senado, em que cada parlamentar tem vencimento mensal de R$ 26.763,13 (sem contar os demais benefícios), os dois salários extras somam R$ 53.446,26 por ano, para cada parlamentar. Ou seja, os 513 deputados e 81 senadores passarão a custar R$ 32,1 milhões a menos por ano ao contribuinte. É quantia que pode reforçar programas na área de saúde, educação ou segurança públicas. Mas, se é expressivo o tamanho da verba, não menos peso terá o efeito moral do passo que os parlamentares darão em favor da credibilidade do Congresso, instituição basilar da democracia.

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