A oposição desidratada a Eduardo Campos, em Pernambuco

Nas raras ocasiões em que é questionado sobre o que se chama em Pernambuco de “nano-oposição”, o governador Eduardo Campos (PSB) tem resposta pronta: “Quem define o tamanho da oposição é a urna”, argumenta. “Com exceção das mudanças de lado e das adesões, ele [Campos] tem razão”, ironiza o deputado estadual Daniel Coelho (PSDB), líder da oposição na Assembleia Legislativa. O parlamentar foi eleito em 2010 pelo PV, que na ocasião tinha candidato próprio a governador – o jornalista Sérgio Xavier – e um discurso crítico a Campos, sobretudo na área ambiental. Passada a eleição, governador reeleito, Xavier foi convidado para a Secretaria Estadual de Meio Ambiente. Aceitou, o PV aderiu e Daniel Coelho rumou ao ninho tucano.

Se as urnas determinam o tamanho da oposição, as injunções do governador também colaboram, e muito, para reduzi-la. Um exemplo foi sua reconciliação, no ano passado, com o senador Jarbas Vasconcelos (PMDB), desafeto por 20 anos. A adesão do pemedebista, até então principal contraponto a Campos, despedaçou ainda mais a oposição local, cuja animosidade em relação ao governador é inversamente proporcional ao seu tamanho.

Atualmente, o PSDB concentra as poucas lideranças de oposição em Pernambuco. O presidente nacional tucano, Sérgio Guerra, é da terra e tem ótimas relações com Campos. Além de Coelho, fazem parte do grupo os deputados estaduais Terezinha Nunes e Betinho Gomes. Os três tucanos têm a companhia de Severino Ramos (PMN). A oposição soma 8% das cadeiras da Casa. Outros sete deputados foram eleitos nas coligações de oposição (PMDB, DEM e PSDB), mas votam com o governo.

Os quatro parlamentares oposicionistas assistem incólumes ao passeio da bancada governista, comandada pelo presidente da Casa, Guilherme Uchoa (PDT), homem da confiança de Campos e que, por isso, caminha para o quarto mandato seguido à frente do Legislativo estadual. A supremacia governista se reflete nos municípios. Entre os 185 prefeitos do Estado, o único reconhecido pelo governo como de oposição é Júlio Lóssio (PMDB), de Petrolina, cidade com o maior PIB do interior de Pernambuco.

“Os prefeitos têm medo e pressionam os deputados de suas bases. Você pode perceber que os quatro deputados de oposição são da região metropolitana. Os do interior não se arriscam”, argumenta Terezinha Nunes, que acaba de reassumir a cadeira perdida em 2010. Naquela eleição, ela foi um dos alvos principais da coalizão liderada por Campos. Não se reelegeu e só voltou após um parlamentar tucano assumir prefeitura, em janeiro. “Por isso eu não atiro pedra em quem se recusa a fazer oposição. Sei dos riscos”, diz.

O principal perigo apontado pela deputada é a retaliação. O prefeito de Petrolina confirma a tese. Diz que o governo estadual devolveu verbas federais destinadas à construção de uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) em seu município. “Fomos prejudicados por sermos de oposição. Encontramos muitos empecilhos, alguns não republicanas”, diz.

Ex-aliado de Jarbas Vasconcelos, que integra a ala rebelde do PMDB, Lóssio pediu votos para o tucano José Serra em 2010. No ano passado, porém, se aproximou da direção de seu partido e, confirmada a candidatura de Campos ao Planalto, pode disputar o governo em 2014.

Uma fonte influente no Palácio do Campo das Princesas, sede do governo, descredencia o prefeito de Petrolina. “Júlio Lóssio tem a pretensão de fazer oposição a Eduardo Campos, mas não tem condições para isso. Assim como a deputada Terezinha Nunes, ele já foi governo e não entregou. As urnas mostraram isso; reelegeram o governador com mais de 80% dos votos”, retruca a fonte.

Lóssio, contudo, está disposto a assumir a missão de desconstruir a gestão de Campos. Ele aponta falhas na saúde. “É uma política muito concentrada na construção de hospitais e pouco na prevenção e atenção básica. Podia ser feito bem mais”, criticou o prefeito, que é médico. Desde que assumiu o governo, em 2007, Eduardo Campos entregou três novos hospitais na Região Metropolitana do Recife e está construindo outro em Caruaru, no agreste.

A educação também é foco do fogo oposicionista. Pernambuco apresenta desempenho discreto no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Na última avaliação, referente a 2011, o Estado aparece em 16º lugar no ranking nacional para o 3º ano do ensino médio. Se considerados os alunos do 9º ano do ensino fundamental, a colocação cai para 20º. “Há uma dificuldade enorme com a prestação dos serviços públicos, apesar da comunicação perfeita deles”, alfineta Daniel Coelho.

O governo, mais uma vez, contesta. Alega ter encontrado o caos no Estado – até então comandado pelo agora aliado Jarbas Vasconcelos – com ordem judicial para contratação de professores e escolas em péssimas condições de manutenção.

Daniel Coelho ganhou notoriedade no ano passado, quando teve votação surpreendente na eleição municipal do Recife, apesar de concorrer contra o PT, que ocupava a prefeitura, e o PSB, de Campos. Uma das principais bandeiras da campanha do tucano – que acabou em segundo lugar, com 28% dos votos válidos – foi justamente a questão ambiental, segundo ele, negligenciada pelo governador.

Nos últimos dois anos, o governo de Pernambuco enfrentou resistências nessa área e acabou recuando de projetos como uma usina termelétrica movida a óleo, orçada em R$ 2 bilhões. Também foram engavetados dois viadutos sobre a principal avenida do Recife e uma usina nuclear no interior. “Temos conseguido mobilizar alguns setores da sociedade contra esse desenvolvimento a qualquer preço”, afirma o deputado.

Celebrado pelo PSB, o modelo de desenvolvimento do governo de Pernambuco se deparou com opositores também na sociedade civil. O movimento “Direitos Urbanos”, criado há um ano pela internet, conta hoje com quase 9 mil membros no Facebook. Algo raro no meio político local, questionamentos ao governador são comuns nas discussões do grupo, cujas mobilizações cresceram em tamanho e repercussão.

Um dos porta-vozes do “Direitos Urbanos”, o professor universitário Leonardo Cisneiros garante que o movimento não tem compromisso político-partidário. Admite, entretanto, que há insatisfação pela forma como o governo lida com questões ambientais e urbanísticas.

Segundo Terezinha Nunes, é comum o envio, ao Legislativo, de projetos para cessão de áreas verdes a empresas interessadas em investir no Estado. “Como tudo é enviado em regime de urgência, não se discute nada. E tudo passa”, relata.

Secretária de Estado durante o governo de Jarbas Vasconcelos (1999-2006), Terezinha ainda não entendeu a união do ex-chefe com Campos. De acordo com ela, o argumento oficial é de que o senador aderiu para “derrotar o PT”. No entanto, apesar das rachaduras na aliança nacional, o PT pernambucano permanece acomodado no governo Campos, ocupando as secretarias de Transportes e de Cultura.

Há três semanas, os quatro deputados de oposição foram barrados na porta do Laboratório Farmacêutico do Estado de Pernambuco (Lafepe), onde pretendiam fiscalizar as condições em que estavam os medicamentos. A direção do laboratório alegou que não houve agendamento da visita. Os oposicionistas solicitaram abertura de uma CPI, sob alegação de que houve quebra de prerrogativa constitucional de fiscalizarem o Executivo. “Me senti no tempo da ditadura”, disse Terezinha Nunes.

As informações são do Valor Econômico

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