Médicos Sem Fronteiras multiplicam rede de solidariedade pelo mundo

Correio do Povo

Médico em ala pediátrica do Chade / Foto: MSF / Divulgação / CP

Milhões de pessoas ao redor do mundo são beneficiadas por profissionais credenciados pelos Médicos Sem Fronteiras (MSF). O trabalho desenvolvido por eles ajuda a mudar tristes realidades e a multiplicar a rede de solidariedade sustentada por doações privadas, que garantem a independência das ações. “As atividades são essenciais, principalmente no contexto dos locais onde atuamos. Na maioria das vezes, somos a única organização presente”, ressalta a diretora da Unidade Médica do MSF Brasil, Carolina Batista.

Especializada em Medicina Tropical, ela sabe bem a importância da organização em determinados países. “O trabalho é fundamental para vários lugares onde não há sistema de saúde. Pessoas morrem por doenças preveníveis”, lembra Carolina, que já atuou em regiões difíceis da Somália e da Líbia. De acordo com a médica, o fato de as pessoas atendidas viverem à margem dos serviços públicos, não justifica que não se ofereça atendimento de qualidade. “Isso é um princípio muito claro para nós. Todo o medicamento e equipamento que usamos é pré-qualificado pela Organização Mundial da Saúde. Parece muito óbvio, mas os preceitos nem sempre são respeitados”, garante. Além de desenvolver projetos, o objetivo da entidade é mostrar que se pode fazer um trabalho de ponta.

A ajuda não termina quando a missão vai embora dos locais socorridos, segundo a diretora. “Construímos hospitais, damos treinamento e capacitamos pessoas. A qualificação profissional geralmente é muito baixa. Também investimos em equipamentos”, esclarece. “Quando saímos de um lugar, não significa que a presença e os benefícios se encerrem. A nossa saída catalisa uma resposta local”, observa.

Para tudo isso, as doações são muito importantes. Elas dão segurança para a organização e garantem neutralidade. “O fato de estimularmos a doação não é só para aumentar o número de atividades. Se tivéssemos mais fundos, poderíamos entrar em países diferentes e desenvolver ações por um prazo mais longo”, justifica. No Brasil há 78 mil doadores, entre os regulares e os ocasionais.

Os brasileiros são reconhecidos pela sua solidariedade e muito procurados para desempenhar ações em outros países. “Somos muito apreciados. Vivemos em um contexto em que já precisamos improvisar muito e o jeitinho brasileiro ajuda em determinadas situações”, salienta.

Carolina ainda destaca que não são apenas as vítimas que ganham com o MSF. Os profissionais também saem enriquecidos e aplicam as experiências vividas em seus países de origem. “O que os profissionais trazem é tanto quanto o que eles levam. A ideia de que só ajudamos é injusta”, acredita. Ela ainda destacou a riqueza cultural agregada, o privilégio de morar em lugares diferentes e a alegria de receber um sorriso de uma criança desnutrida que quase não tinha chance de sobreviver com as vantagens de se participar dos programas. Essa foi a recompensa que o médico Guillaume Mazambi recebeu ao examinar um paciente em uma ala pediátrica improvisada no hospital da província de Am Timan, na República do Chade.

Experiência que transforma a vida

Ninguém volta o mesmo de uma missão do MSF. Com a pediatra gaúcha Cristine Hoffmann não foi diferente. No ano passado, ela passou o tempo de uma gestação em Maputo, capital de Moçambique, cuidando de fetos que estavam por nascer e cujas mães eram portadoras do vírus HIV. Além disso, ela tratava de meninos e meninas contaminados e participava da coordenação de projetos junto ao Ministério da Saúde local.

Na região onde a médica estava, a predominância de crianças com Aids chegava a ser de uma para cada seis. “É uma incidência muito grande e trabalhávamos também com a prevenção”, lembra. O trabalho dela e dos outros profissionais ajudou a começar uma mudança de realidade. “Cada exame negativo era uma vitória. Algo que não tem preço”, observa. Hoje, com 31 anos, a médica avalia que a experiência modificou sua forma de pensar e de olhar o mundo.

Enfermeiro sobrevive ao ebola

Vítima do ebola, o enfermeiro ugandense Kiiza Isaac sobreviveu à doença graças ao trabalho do MSF. Sua história de vida contribuiu para que se juntasse à organização para salvar vidas. Em 2007, Kiiza e parte de sua família foram infectados, porque não havia equipamentos de proteção na instituição onde atuava. “Fui contaminado ao colher amostras de sangue dos doentes e comecei a apresentar os mesmos sintomas”, conta.

Naquele ano, o Ministério da Saúde foi informado sobre uma doença estranha na região e se identificou o surto de ebola. Equipes do MSF foram a Bundibugyo, onde a enfermidade predominava, e ficaram à frente de um centro de tratamento, assim como em Kagadi. “Muitos pacientes receberam cuidados. Graças a Deus, eu sobrevivi. Depois de me recuperar, juntei-me ao MSF e ao Ministério da Saúde para lidar com pacientes de ebola”, lembra. Em 2008, Bundibugyo foi declarada livre da doença.

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