Gestão Doria ajudou Ambev ganhar licitação do Carnaval, diz CBN

Carnaval em São Paulo: secretários André Sturm (Cultura) e Anderson Pomini (Justiça) negaram que houve direcionamento em favor da Ambev (Foto/Reuters)

A gestão do prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), teria orientado a agência de eventos Dream Factory, contratada pela Ambev, para vencer a concorrência pelo patrocínio do Carnaval, informa a rádio CBN.

De acordo com a emissora, a empresa venceu o edital ainda no ano passado, mas em janeiro a Comissão Avaliadora da Secretaria de Cultura decidiu que a proposta da SRCOM, parceira da Heineken, era a melhor porque oferecia mais itens de interesse público.

Segundo a CBN, no entanto, o áudio de uma reunião entre funcionários da Secretaria de Cultura e dois diretores da Dream Factory mostra que os representantes narram um encontro na Prefeitura, no dia 17 de fevereiro, em que supostamente o vice-prefeito Bruno Covas (PSDB) teria orientado os integrantes da Ambev e da Dream Factory a alterar os itens da planilha da proposta para justificar os R$ 15 milhões oferecidos inicialmente e, assim, vencer a concorrente, que ofereceu R$ 8,5 milhões.

De acordo com a publicação, a Comissão Avaliadora da Secretaria de Cultura teria identificado que apenas 2,6 milhões de reais da proposta da Dream Factory seriam gastos em itens de interesse público, como segurança, limpeza e ambulâncias. Na proposta da SRCOM, 5,1 milhões seriam destinados para esse fim.

Veja os trechos da gravação obtida pela CBN:

DIRETOR DA DREAM FACTORY 1 – A Ambev é a única que pode fazer o que o secretário [André Sturm] quer. Que é aumentar o valor. É a única…

CHEFE DE GABINETE – Isso, aumentar o valor, exatamente

DIRETOR 1 – E a Ambev vai querer envolver o prefeito nessa reunião. Eu acho que vai dar uma m… do c…

CHEFE DE GABINETE – Não tem problema. Mas o prefeito já voltou de Dubai?

DIRETOR 1 – Não sei, a gente vai envolver o prefeito ou o Bruno [Covas]. Acho que não vai ser boa essa reunião.

CHEFE DE GABINETE – Mas o Bruno inclusive estava nessa reunião em que eles conversaram…

DIRETOR 1 – Ele lembra, o Bruno lembra.

DIRETOR DA DREAM FACTORY 2 – Ele deu a saída e saiu.

CHEFE DE GABINETE – Ah, ele não ficou?

DIRETOR 2 – Ele deu a solução para o André [Sturm], largou no colo do André…

CHEFE DE GABINETE – Aí ficou o [Julio] Semeghini, o secretário do governo?

DIRETOR 1  –  (inaudível) A Ambev…

DIRETOR 2 – (Tinha) a oferta de R$ 15 milhões (da Dream Factory) , a de R$ 8 milhões (da SRCOM), está dito no edital que você pode mexer nos escopos.

CHEFE DE GABINETE – Aí mexe nos escopos?

DIRETOR 2 – Aí ele [Bruno Covas] levantou e foi embora. Aí o André falou “Se eu perguntar oficialmente, vocês responderem oficialmente, eu resolvo.”

O que diz a gestão Doria 

Em nota enviada a EXAME.com, a prefeitura negou qualquer irregularidade e afirmou que o episódio foi o retrato de um “esforço do poder público para que se obtivesse o maior benefício possível à população: a ação da Prefeitura de São Paulo permitiu à cidade ter um Carnaval com maior qualidade sem nenhum gasto público, ao contrário do que ocorreu em 2016, quando foram investidos R$ 10 milhões de recursos do município”.

“Como o edital permitia, foi solicitado à Dream Factory que alterasse o conteúdo de sua proposta, para que esse valor se destinasse inteiramente a serviços de interesse público (segurança, ambulâncias, banheiros químicos)”, diz a nota.

Segundo a prefeitura, a mesma possibilidade não poderia ter sido oferecida à SRCOM, “uma vez que o edital não permitia que o valor da proposta fosse alterado, apenas sua composição, desde que dentro do escopo. Ou seja, a SRCOM não poderia oferecer R$ 15 milhões em serviços”.  Veja a nota na íntegra ao final desta reportagem.

Os secretários André Sturm (Cultura) e Anderson Pomini (Justiça) negaram que houve direcionamento e afirmaram que todo o processo cumpriu os itens do edital.

A Ambev afirmou que o edital previa a redistribuição dos valores da proposta entre os itens e sustenta que não houve oferta de novo valor durante a concorrência.

A Drem Factory afirmou que todas as mudanças no edital foram autorizadas pela comissão e que foram lícitas.

A íntegra da nota da prefeitura sobre o caso:

“A reportagem da CBN se esforça para fazer parecer haver irregularidade onde houve esforço do poder público para que se obtivesse o maior benefício possível à população: a ação da Prefeitura de São Paulo permitiu à cidade ter um Carnaval com maior qualidade sem nenhum gasto público, ao contrário do que ocorreu em 2016, quando foram investidos R$ 10 milhões de recursos do município.

O edital, elaborado e publicado pela gestão passada, foi inteiramente obedecido. Como previsto, a empresa que havia feito a maior oferta financeira foi chamada a esclarecer sua proposta. Ainda conforme previa o edital, foi permitido que a esta empresa, a Dream Factory, alterasse os itens de investimento, mas mantendo-se dentro do escopo do que já havia sido apresentado.

Pare que fique claro: a proposta da SRCOM foi de R$ 8,5 milhões; a da Dream Factory, de R$ 15 milhões. O conteúdo da proposta de maior valor, porém, foi julgado insatisfatório pela comissão, pois boa parte dos recursos era destinada a ações de marketing. Como o edital permitia, foi solicitado à Dream Factory que alterasse o conteúdo de sua proposta, para que esse valor se destinasse inteiramente a serviços de interesse público (segurança, ambulâncias, banheiros químicos).

À diferença do que sugere a reportagem da CBN, o mesmo não poderia ser oferecido à SRCOM, uma vez que o edital não permitia que o valor da proposta fosse alterado, apenas sua composição, desde que dentro do escopo. Ou seja, a SRCOM não poderia oferecer R$ 15 milhões em serviços. Se fosse mantida a decisão de dar vitória à SRCOM, a Prefeitura teria, portanto, de investir pelo menos R$ 10 milhões no Carnaval.

Cabe mencionar que, se houvesse qualquer intenção de praticar irregularidades por parte dos funcionários públicos envolvidos, os atos da comissão não teriam saído divulgados em ata publicada no Diário Oficial, nem a ocorrência da reunião seria confirmada pela Prefeitura.

Os “especialistas” consultados pela CBN, evidentemente, falam sem conhecimento do edital de chamamento e dos decretos municipais que regulam contratos como esse. Não houve contato para favorecer uma das empresas, houve contato com a única empresa que teria condições de melhorar sua proposta, em benefício da população paulistana e do Carnaval.

Um indicativo de que nada de errado foi feito é o fato de que a SRCOM, que segundo a CBN teria sido prejudicada, não recorreu e nem mesmo se manifestou na reportagem. Com base num relatório de auditores do Tribunal de Contas do Município, a CBN dá como fato comprovado que tenha havido irregularidades no edital e no processo de escolha. Deixa de informar a seus ouvintes que, a esta altura, as supostas irregularidades são apenas a opinião dos auditores, uma vez que o relatório não passou pela análise do conselheiro responsável nem foi a julgamento.

A Prefeitura ressalta ainda que saúda a decisão do Ministério Público de abrir investigação a respeito do patrocínio ao Carnaval de 2017. Assim, ficará comprovado ao final que foi cumprida a lei e que a ação da administração municipal beneficiou a população, que pode ter acesso a um Carnaval com mais qualidade, preservando os cofres públicos, que deixaram de investir R$ 10 milhões.”

Fonte: Estadão Conteúdo

.