Ex-ministro do STF denuncia ‘ditadura dos partidos’ e lança apelo ao Congresso: é hora de criar ‘candidaturas avulsas’ no Brasil

Geneton Moraes Neto

O Dossiê Globonews leva ao ar neste sábado, às 19h05 (com reapresentação no domingo, às 14h39), uma entrevista com o ex-integrante do Supremo Tribunal Federal e ex-presidente da Câmara dos Deputados Célio Borja, em que ele faz um apelo ao Congresso Nacional em defesa daquilo que seria uma grande novidade no cenário político brasileiro: a adoção de candidaturas independentes. Em resumo: qualquer cidadão brasileiro teria o direito de se lançar candidato a cargos no Legislativo no Executivo – inclusive à Presidência da República – sem precisar se filiar a partidos políticos.

O ministro diz que a existência de tais candidaturas seriam uma bela demonstração de liberdade no exercício de direitos políticos.
Borja usa palavras duras ao se referir ao cenário político: diz que os partidos exercem, hoje, uma “ditadura”. Quem não se filiar não pode se candidatar a nada – nem no Legislativo nem no Executivo.
Em meio à fogueira do debate político que incendeia paixões, divide brasileiros e, por vezes, beira a irracionalidade, eis aí uma contribuição interessante: a existência de “candidaturas avulsas” deveria ser discutida, sim, pelo Congresso Nacional. Por que não?
O “problema” é que os partidos dificilmente aceitariam abrir mão do “poder” que hoje exercem sobre a escolha de candidatos.
Aos 87 anos, Célio Borja se enquadra no figurino do clássico liberal. Durante o regime militar, foi líder do governo Geisel na Câmara dos Deputados, mas se movia para tentar evitar, por exemplo, a truculência das cassações de mandatos.
Quando estava a ponto de naufragar nas ondas do impeachment, o então presidente Fernando Collor convocou, como se sabe, um “ministério de notáveis”. Chamou Célio Borja para o Ministério da Justiça. Parlamentarista desde sempre, Borja aceitou o convite porque o presidente lhe atribuíra uma missão específica: tentar apressar a implantação do parlamentarismo no Brasil. Se, por acaso, o parlamentarismo fosse implantado no Brasil, o presidente reinaria mas não governaria. Viraria uma figura “cerimonial”. Os planos parlamentaristas não chegaram a ser executados: a entrevista-bomba de Pedro Collor, irmão do presidente, à revista Veja sobre o esquema de corrupção no governo apressou a queda de Fernando Collor.
Um trecho da entrevista do ex-ministro ao Dossiê Globonews:


GMN:
O senhor já declarou que sentiu um grande desencanto: não conseguiu que a a Câmara aprovasse a existência de candidatos avulsos e independentes. Ou seja: o senhor defende a ideia de que qualquer cidadão brasileiro deve ter o direito de se candidatar sem estar filiado a um partido. Isso melhoraria a representação?


BORJA
: “Primeiro, acho extremamente inconveniente a ditadura dos partidos- que se transformaram em ditaduras. A Constituição fez uma loucura: condicionou a candidatura a cargos eletivos à apresentação de um partido. Se você não for membro de um partido e ele não lhe apoiar a candidatura, você não é nada, não pode ser nada. Como se pode quebrar essa ditadura? Penso que a maneira mais simples é a inglesa: você pode ser candidato avulso. Você se apresenta com o apoio de um número determinado de eleitores. Quinze, vinte mil eleitores apresentam a candidatura. Fazem as vezes do partido. Tornam séria a candidatura, portanto – porque, se você fosse candidato de você mesmo, não tinha muita graça…Mas, dessa maneira, não: você tem o apoio expressivo de uma parte do eleitorado e, portanto, mostra que tem condições também de se eleger. Penso que essa é uma salvaguarda contra a tiranização que os partidos exercem sobre a vida política”.


GMN
: A existência de candidatos avulsos valeria para a Presidência da República também? isso não abriria caminho para aventureiros?


BORJA:
“Abre. Mas aventureiros você tem em qualquer regime eleitoral, essa é que é a verdade. Temos visto gente que está na base da pura aventura. Candidatura avulsa teria uma enorme vantagem: é uma forma de você minorar – você não elimina, mas minora muito – a ditadura dos partidos”.


GMN:
O senhor faria um apelo ao Congresso, então, pela adoção de candidaturas avulsas?


BORJA:
“Faria, sem dúvida nenhuma – com as cautelas que o Congresso entendesse razoáveis. Mas é preciso que se ponha um contrapeso a essa ditadura partidária – que está arruinando o Brasil e aviltando a vida política”.


GMN:
Qual o primeiro argumento que o senhor usaria?


BORJA
: “O da liberdade do exercício dos direitos políticos. Porque os direitos políticos devem ser exercidos amplamente. Que a candidatura avulsa ajuda a contrabalançar a onipotência partidária, ajuda. Isso ninguém pode negar. O grande problema é o dinheiro”.

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